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segunda-feira, 24 de maio de 2010

Teatro de Gil Vicente

Mentalidade medieval - ambientado no início da Era Moderna, mas ainda reflete o pensamento medieval.
Características:
1) teatro alegórico - as barcas são alegorias da morte;
2) teatro de tipos - classe social, profissão, sexo, idade. Exemplos do Auto da Barca do Inferno:
Fidalgo
Onzeneiro
Parvo
Procurador/ Corregedor
3) Teatros de quadros: sucessão de cenas, chegando a um ponto culminante e desfecho.
4) Rupturas da linearidade do tempo e despreocupação com a verossimilhança: na farsa O Velho da Horta - pela manhã a mocinha procura o velho para comprar os temperos, no final do diálogo, o criado vem avisar-lhe que já é noite.
5) Teatro cômico e satírico. A maioria das peças são comédias de costumes, seguindo o lema latino: “Pelo riso corrigem-se os costumes”. Personagens caricaturais. Sua linguagem faz cócegas na platéia.
Gil Vicente
Com uma biografia das mais controvertidas, poucos fatos são tidos como certos na vida de Gil Vicente. Nascido por volta de 1465. Aproveitou-se do prestígio que a função de organizador das festas da corte lhe conferia para, em 1502, encenar sua primeira peça, o Monólogo do vaqueiro ou Auto da visitação, na câmara da rainha D. Maria, em comemoração ao nascimento de D. João III. Durante trinta e quatro anos Gil Vicente fez representar dezenas de peças. Em 1562, seu filho, Luís Vicente, publicou a Compilagem de todalas obras de Gil Vicente.
Características do teatro vicentino
Escrita em 1517, Auto da Barca do Inferno é das obras mais representativas do teatro vicentino. Como em tantass outras peças, nesta o autor aproveita a temática religiosa como pretexto para a crítica de costumes. Num braço de mar estão ancoradas duas barcas. A primeira, capitaneada pelo diabo, faz a travessia para o inferno; a segunda, chefiada por um anjo, vai paa o céu. Uma a uma vão chegando as almas dos mortos - um fidalgo, um onzeneiro (agiota), um parvo (bobo), um sapateiro, um frade, levando sua amante, uma alcoviteira, um judeu, um corregedor (juiz), um procurador (advogado do Estado), um enforcado e quatro Cavaleiros de Cristo (cruzados) que morreram em poder dos mouros. Todos tentam evitar a barca do diabo. Mas apenas o parvo e os cruzados conseguem embarcar para o céu.
Ambientado no início da Era Moderna, o teatro vicentino ainda reflete o pensamento medival por sua moral religiosa e sua concepção teocêntrica do mundo.
No Auto da Barca do Inferno, por exemplo, ao ver-se recusado pelo anjo, o fidalgo assim se lamenta por ser dissipado sua vida sem acreditar no castigo do inferno.
Ao inferno todavia!
Inferno há aí para mim?!
Ó triste! Enquanto vivi
nunca cri que o aí havia.
Tive que era fantasia
folgava ser adorado;
confiei em meu estado
e não vi que me perdia.
2. Teatro popular
Apesar dos elementos ideológicos inovadores que suas sátiras sociais contêm, Gil Vicente não se deixou influenciar pelas novidades estéticas introduzidas pelo Renascimento. Sua obra é a síntese das tradições medievais e populares.
“... o seu teatro não pode ser jamais entendido se analisado e concebido segundo os padrões de uam estética que não seja a estética do teatro popular”. (Segismundo Spina)”
Vale então fazer uma breve análise da obra de Gil Vicente à luz da estética do teatro popular medieval.
Teatro alegórico: rperesenação de idéias abstratas com personagens, situações e coisas concretas. O Auto da Barca do Inferno, por exemplo, é uma peça alegórica. O cais e as barcas são a alegoria da morte; a barca do inferno é alegoria da condenação da alma; a barca do céu, a da salvação.
Teatro de tipos: as personagens de Gil Vicente são sempre típicas, isto é, não são indíduos singulares nem possuem traços psicológicos complexos; pelo contrário, apenas reúnem os caracteres mais marcantes de sua classe social, de sua profissão, de seu sexo, de sua idade.
Teatro de quadros: em geral, as peças de Gil Vicente desenvolvem-se por uma sucessão de cenas relativamente independentes, sem formar propriamente um enredo, uma história que, depois de apresentada, se complica até um ponto culminante e um desfecho.
No Auto da Barca do Inferno temos uma introdução em que aparecem o diabo e seu companheiro preparando a barca e anunciando a vigem; com a chegada do fidalgo, inicia-se o primeiro quadro, e os outros se sucedem sempre com a mesma estrutura: chegada da personagem, diálogo com o diabo, tentativa de embarque para o céu e, se a personagem é recusada pelo anjo, retorno à busca do inferno.
Rupturas da linearidade do tempo e despreocupação com a verossimilhança: mesmo nas peças que possuem um enredo, a sucessão cronológica dos acontecimentos é freqüentemente inverossímil ou mesmo absurda.
Na fasra O velho e a horta, um velho hortelão apaixona-se por uma mocinha, pela manhã, o procura para comprar temperos. Ao final do primeiro diálogo, um criado vem avisar-lhe que já é noite e que sua mulher o espera para jantar. Malsucedido em seus galanteios, o velho apaixonado contrata os serviços de uma alcoviteira, que lhe arranca dinheiro para comprar presentes e empreender a conquista. Numa de suas visitas, a alcoviteira é presa e açoitada. Desconsolado, o velho recebe a notícia do casmento da lmoça por quem se apaixonara. tudo isso aconece numa sucessão ininterrupta, marcada apenas pela entrada e saída de personagens, e a única marcação de tempo, como se viu, é inverossímil.
Teatro cômico e satírico: as peças de Gil Vicente, em sua maioria, são comédias de costumes, seguindo o lema latino ridendo castigat mores (pelo riso corrigem-se os costumes). O dramaturgo lança mão de inúmeros recursos eficientes para provocar o riso: personagens caricaturais; situações absurdas; desencontros imprevistos e ridículos. Mas é sobretudo o poder de sua linguagem que faz cócegas na platéia.
Observe o recurso à linguagem popular nos xingamentos do povo ao diabo (Auto da Barca do Inferno).
Hiu! Hiu! Barca do cornudo,
Pero Vinagre beiçudo
(............................................)
Sapateiro da Candosa!
Entrecosto de carrapato!
Hiu! Hiu! Caga no sapato,
filho da grande aleivosa!
Tua mulher é tinhosa
e há de parir um sapo
chentado (=pregfado) no guardanapo!
Neto da cagaminhosa!
Furta-cebolas! Hiu! Hiu!
‘scomungado nas igrejas!
Burrela, cornudo sejas!
Principais obras de Gil Vicente
Auto da visitação (ou Monólogo do vaqueiro - 1502).
Auto pastoril castelhano (1509)
Aujto da Índia (1509)
O velho da horta (1512)
Quem tem farelos? (1515)
Trilogia das Barcas:
* Auto da Barca do Inferno (1517)
* Auto da Barca do Purgatório (1518)
* Auto da Barca da Glória (1519)
Farsa de Inês Pereira (1524)
Auto da feira (1526)
O juiz da Beiras (1526?)
Farsa dos almocreves (1527?)
O clérigo da Beira (1529)
Auto da Lusitânia (1532)
Romagem dos agravados (1533)
Floresta de enganos (1536)
Texto
Este fragmento foi retirado do Auto da Lusitânia (1532). Lediça é filha de um alfaiate judeu. Estando sozinha, varrendo a loja, chega um cortesão, freguês de seu pai, que inicia uma tentativa de conquista amorosa. Os galanteios do conquistador são uma paródia da linguagem do amor cortês que você estudou nas cantigas amor.
Cortesão: Não devia tal senhora
como vós andar varrendo,
senão enfiar aljofre
e perlas orientais;
não sei como isto se sofre.
Lediça: Minha mãe tem no seu cofre
duas voltas de corais.
Cortesão: Senhora, sou cortesão,
(...................................................)
Mas vosso e não de ninguém
é tudo o que está comigo,
e quero-vos grande bem.
Lediça: Bem vos queira Deus amém;
querereis outra coisa, amigo?
Cortesão: Temo muito que me deixe
vosso amor pobre coitado
de favor com que me queixe.
Lediça: Lançai na sisa do peixe,
e logo sois remediado.
Cortesão: Não falo, senhora disso,
porque eu me queimo e arço
com dores de coração.
Lediça: Muitas vezes tenho eu isso:
diz Mestr’Aires que é do baço,
e reina mais no verão.
Cortesão; Mas, senhora, por amar
fiz minha sorte sujeita,
e pedi a mais andar.
Lediça: Crede, senhor, que o jogar
poucas vezes aproveita.
(...............................................)
Cortesão: Ó doce flor entre espinhas,
crede o amor sem mudança
que vos tenho e que vos digo.
Assim umas primas minhas
e toda esta vizinhança
todos têm amor comigo:
(................................................)
Cortesão: Senhora, por piedade
que entendais minha razão;
entendei minha vontade,
e mudarei a tenção:
entendei bem minha dor
e mil maleitas quartãs,
que por vós me hão-de-matar.
Lediça: Assim é meu pai, senhor,
que tem dores d’almorrãs,
que é coisa d’apiedar.
Foi o ano tão chacoso
de doenças da má ora,
que creio bem o mal vosso.
(...........................................)
Piter Oliveira =D

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